Em regra, a Constituição Federal proíbe que uma pessoa acumule cargos ou empregos públicos. Entretanto, a própria Constituição prevê exceções a essa regra, em seu art. 37, XVI, dentre as quais, destaca-se “a de dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde, com profissões regulamentadas”, quando houver compatibilidade de horários.
Contudo, objetivando disciplinar a matéria, a Advocacia Geral da União (AGU) emitiu, em 1998, o parecer nº GQ-145, vinculante, afirmando que o servidor somente poderia acumular cargos se houvesse compatibilidade de horário e desde que a jornada máxima não ultrapasse 60 (sessenta) horas semanais. Isso porque a jornada desses profissionais poderia ficar demasiadamente cansativa, o que comprometeria seu desempenho profissional e afetaria sua eficiência.
Desde então, esse limite de carga horária vem sendo observado e diversos servidores públicos procuraram a Justiça para conseguir a permissão de acumular cargos que extrapolavam às 60 (sessenta) horas indicadas, o que vinha sendo negado pelo Superior Tribunal de Justiça.
Entretanto, no recurso REsp 1.767.955-RJ de relatoria do Ministro Og Fernandes, julgado em 27/03/2019, a 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, adequou seu entendimento à posição do Supremo Tribunal Federal, autorizando uma enfermeira a acumular cargos que ultrapassavam 60 horas semanais.
Decidiu-se que a acumulação de cargos públicos de profissionais da área de saúde, prevista no art. 37, XVI, da CF/88, não se sujeita ao limite de 60 horas semanais previsto em norma infraconstitucional, pois inexiste tal requisito na Constituição Federal.O único requisito estabelecido para a acumulação é a compatibilidade de horários no exercício das funções, cujo cumprimento deverá ser aferido pela administração pública.
Assim sendo, no cenário jurídico atual, é plenamente possível que profissionais de saúde cumulem cargos públicos, nos termos previstos no art. 37, XVI, da Constituição Federal, ainda que ultrapassem 60 horas semanais, já que a própria Constituição exigiu apenas a observância da compatibilidade de horários, o que afasta, portanto, o citado parecer da Advocacia Geral da União que orientava em sentido diverso.
A orientação do Tribunal de Contas da União sobre a questão é que a impossibilidade de acumulação de cargos acumuláveis deverá ser analisada no caso concreto, sem que haja limite objetivo quanto à carga horária. Nesse sentido: Acórdãos 1.338/2011-TCU-Plenário, de relatoria do Ministro Augusto Nardes, e 1.168/2012-TCU-Plenário, de relatoria do Ministro José Jorge.
Mayara Mendes, advogada, membro do Escritório Bertassone Advogados, Pós-graduada em Direito Público pela Universidade Cândido Mendes (2018); Pós-graduanda em Direito Tributário pela Universidade Cândido Mendes (foto por Erika Medeiros).